“Uma viagem em torno de interiores históricos”: este poderia ter sido o subtítulo dos dois dias e meio que passei em Amsterdão com a minha mãe. O pretexto da viagem foi ver a exposição de Vermeer que está a decorrer no Rijksmuseum, mas acabou por ser muito mais que isso. Foram dois dias e meio intensos mas simultaneamente tranquilos, de muitas caminhadas e muito estímulo visual, e regressei com uma sensação curiosa de cérebro limpo, meio esvaziado, mas ao mesmo tempo a borbulhar de ideias e inspiração.
O facto de ter estado sol (uma sorte!), de não haver praticamente carros no centro de Amsterdão (que sossego!), de só ter pegado no telemóvel para tirar fotografias e telefonar para casa, tudo confluiu de para essa sensação de “leveza cerebral” que senti quando aterrei em Bilbao (e que, infelizmente, já se desvaneceu). Mas, verdadeiramente, aquilo que realmente me marcou foi ter podido ver tantos interiores históricos de um só fôlego: tanto nos quadros de Vermeer, que pintou a domesticidade com uma luminosidade e uma sensibilidade fora de série, bem como noutros quadros do Rijksmuseum, e principalmente nas casas-museus que visitámos.
Já vos falei aqui no meu entusiasmo por casas-museus e Amsterdão tem um sem-fim de casas deste tipo (este livro é um bom guia). Ficaram muitas por ver, mas aconselho vivamente estas:
Museum Ons' Lieve Heer op Solder (Museu Nosso Senhor no Sótão): uma casa no canal com uma igreja católica no sótão. Dizer que é extraordinária é pouco. Esta casa ficou congelada no século XVII, nem percebo bem como, visto que se passou tanta coisa nos últimos 400 anos e as casas estão constantemente a mudar de donos e a serem remodeladas. É talvez o sítio com mais ambiente onde já estive na minha vida.
Casa-Museu Rembrandt: a casa onde Rembrandt viveu de 1639 a 1658. Esta casa sofreu várias transformações ao longo dos séculos e foi transformada em museu no princípio do séc. XX. Percorrer as diferentes divisões é quase como entrar nos quadros de Pieter de Hooch ou de Vermeer. Muito bonita, mas infelizmente estava cheia de gente…
Het Grachtenhuis: algumas salas com decoração do século XVIII, um jardim muito giro e uma exposição interactiva muito bem feita sobre a história de Amsterdão e dos seus canais. Vale a pena.
Museu Van Loon: de momento está com uma exposição que não deixa ver os interiores da casa, o que foi uma pena, porque o pouco que vi era realmente bonito. Conseguimos ver a cozinha (que adorei), o jardim e as antigas cocheiras. Tenho mesmo de lá voltar na próxima vez que estiver em Amsterdão.
Huis Willet-Holthuysen: uma casa muito opulenta, com interiores do séc. XIX. Gostei especialmente da cozinha.
Esta abundância de interiores e de imagens de interiores fez-me pensar que há aqui muitas ideias que podem ser transferidas e adaptadas às nossas próprias casas. Ora vejam:
Madeiras pintadas de cores fortes, sejam elas vigas de tecto, caixilharias de janelas, corrimãos, portas, armários… Os tons são fortes, assumidos, mas com a doçura das cores históricas… são cores intensas mas não estridentes.
Tapetes orientais a cobrir mesas: aparentemente, a razão pela qual os tapetes se colocavam em mesas e não no chão tinha a ver com o facto de serem tão caros, mas não há dúvida de que, numa mesa, podemos apreciar muito melhor as cores e os motivos. Fiquei especialmente impressionada com a forma como Vermeer pintou a textura da lã neste quadro:
Cerâmica azul e branca: claro que em Amsterdão grande parte da cerâmica do séc. XVII é de Delft, mas podemos facilmente usar peças de outras proveniências. Nestas casas há cerâmica azul e branca por todo o lado: azulejos a cobrir cozinhas de alto a baixo ou simplesmente utilizados como rodapés; objectos utilitários como jarras, pratos, taças…
Camas em armários: que hoje em dia podemos adaptar a camas em recantos, junto a janelas ou vãos, protegidas por cortinas (alguns exemplos aqui).
Paredes cheias de quadros: aquilo a que agora chamamos “gallery wall” ou “salon style” já se fazia no séc. XVII. Nessa altura a compra de pinturas era tão prevalente que todas as classes sociais tinham as suas casas cheias de quadros… até nas cozinhas os penduravam!
Tecido usado para cobrir as paredes de um quarto: os franceses são os campeões disto, mas gostei de ver esta maneira fácil e engenhosa, recorrendo simplesmente a pregos e ilhoses.
É certo que a arquitectura destas casas holandesas construídas no séc. XVII joga muito a seu favor — tectos altos, janelões, chãos em materiais bonitos (mosaicos de mármore ou de tijoleira) — e isso é mais difícil de replicar nas nossas casas, mas espero que tenham gostado deste apanhado de imagens e ideias que podemos pôr em prática sem grande dificuldade.
Ate à próxima,
Constança
Maravilhoso! Obrigada pela partilha!
lindíssmo!! obrigada pela partilha de todos estes pormenores que talvez a outros olhos tivessem passado despercebidos! Maravilhoso!